“O Presidente dos Santos não nos fez mal a ponto de nós perseguirmos a família”

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O jornal JEUNE AFRIQUE, fez uma entrevista exclusiva a João Lourenço, tendo questionado ao actual presidente da União Africana, o que poderia responder a luta contra a corrupção que foi, por vezes, criticada por sua selectividade, supostamente mirando principalmente a família Dos Santos e seus aliados.

PR João Lourenço – Isso é especulação alimentada pelos visados ou pessoas próximas dos visados, mas se eu citar os casos de entidades que estão a contas com a Justiça, então diremos que a família Dos Santos é composta por milhões de pessoas. Não sei se me está a entender…

Agora mesmo está a decorrer um caso de corrupção na Administração Geral Tributária, AGT. São familiares do Presidente Dos Santos? Não são! O ex-ministro dos Transportes teve um processo na Justiça, é familiar do Presidente Dos Santos? Não é! O caso que eu acabei de citar agora, dos 900 milhões que estão na Suíça, o detentor desse recurso é familiar do Presidente Dos Santos? Não é!

Então, é uma acusação sem fundamento e que procura dizer que é uma perseguição por razões políticas. Nós não entendemos porquê. O Presidente Dos Santos não nos fez mal a ponto de nós perseguirmos a família.

E quando são os tribunais a ditar sentenças, as sentenças são indiscutíveis. A única forma de se contestar a sentença de um tribunal é, a parte lesada, com os seus advogados, recorrerem junto das instâncias de recurso. E as instâncias de recurso dirão se as sentenças foram justas ou não foram justas.

Quem está sentado em frente a um tribunal com a toga preta – no caso de Angola é preta -, não é um político, é um juiz. Não é o Presidente da República que está lá sentado, não é nenhum ministro. Quem está a exercer aquela função de juiz, do júri, não é uma pessoa, é um júri. Esse júri não é composto por pessoas nomeadas por despacho pelo Presidente da República ou por qualquer outro político.

Então, as sentenças nunca são políticas. As sentenças são baseadas na Justiça, no Código Penal. Já temos tido casos de suspeitos de corrupção que chegam até ao tribunal e são absolvidos.

Se foi absolvido é porque o tribunal, que é o único órgão competente em dizer se houve crime ou não houve crime, concluiu, para aquele caso concreto, que, embora tivesse havido a suspeição, nada se prova. Já houve casos desses.

JEUNE AFRIQUE – Recentemente, o Senhor concedeu perdão ao filho do seu antecessor, José Filomeno dos Santos. Sua meia-irmã, Isabel dos Santos, poderia receber o mesmo perdão caso retornasse a Angola? 

PR João Lourenço – Não me fale de casos concretos. Bom, primeiro é que o indulto só é dado a quem já foi julgado e condenado. Portanto, a resposta creio que está clara. Para quem não foi julgado nem condenado, não se pode sequer falar de indulto, de perdão, de amnistia.

Só é indultado quem foi julgado e condenado, depois de cumprida uma boa parte da pena que lhe foi atribuída. Não pode ser julgado hoje e amanhã ser indultado. São regras universais em qualquer país democrático do mundo.

JEUNE AFRIQUE – Vamos falar um pouco sobre política interna. As próximas eleições em Angola estão previstas para 2027. Mas vou me referir às anteriores, as de 2022, que foram eleições um tanto difíceis para o MPLA. O MPLA perdeu muitos votos e também perdeu cadeiras no Parlamento em comparação com as eleições de 2017. A que o Senhor atribui esse recuo do MPLA?

PR João Lourenço – O MPLA não perdeu as eleições. O MPLA obteve mais de 51% de votos, no geral. E é normal que perca num município, perca numa província. Mas o que conta, para ser governo, é o resultado definitivo, o geral, o global. Portanto, o MPLA ganhou, com esses mais de 51% obtidos, legitimidade suficiente para governar como se tivesse tido 75%. Não tem diferença.

Você ganha com 75%, tem legitimidade para governar. Ganha com os 51%, 52, 53, tem exactamente a mesma legitimidade. Nós temos visto, pelo mundo fora, particularmente na Europa, os mesmos que, às vezes, procuram insinuar que nós não ganhamos o suficiente para governar, até insinuam que devíamos fazer coligação com o segundo classificado, para podermos ter paz e governar em paz, nos países deles, esses mesmos governam sem sequer atingir 30%. Com menos de 30%, eles são governo. E não admitem que alguém de fora lhes diga que você não tem legitimidade suficiente para governar.

No entanto, ele nem chegou a 30%. E a diferença entre os votos que ele alcançou e o segundo classificado, às vezes, é inferior a 1%. Então, eu não entendo, às vezes, quando se coloca este problema da perda de votos. É normal! A conjuntura de Angola de hoje não é a mesma de há 40 anos. O que diriam se o MPLA continuasse a ganhar por 70%, 75, 80?

Nós já tivemos eleições em que alcançámos 83.4% dos votos, 83. O que é que o mundo diria se, em todas as eleições, o MPLA mantivesse esse nível de votação de mais de 80%? O que é que diriam? Falariam bem, ou falariam mal? Aí sim, diriam que é fraude.

JEUNE AFRIQUE – Senhor Presidente, houve também um declínio na taxa de participação, o que é algo importante. Em 2017, a taxa de participação era de 76%, mas em 2022 caiu para 46%. Não há, de certa forma, uma perda de adesão da população à democracia eleitoral? Talvez as pessoas não acreditam mais no processo?

PR João Lourenço – Senhor François Soudan, esse fenómeno é universal. Esse fenómeno que acaba de dizer é universal, e contra isso não há nada a fazer. É universal. Acontece em Angola, acontece nos outros países africanos, acontece muito mais na Europa e nos Estados Unidos do que no nosso continente.

É um fenómeno universal que está a acontecer. Bom, todo o mundo tem que reflectir sobre as razões do que está a acontecer e pensar o que fazer. Mas não me parece que haja alguma coisa a fazer.

Países desenvolvidos, não desenvolvidos, países ricos, países pobres, este fenómeno do elevado número de abstenção, da fraca participação no processo eleitoral, na votação, é um fenómeno que é universal, não é de Angola.

JEUNE AFRIQUE – O MPLA não é o único. Vimos a FRELIMO em Moçambique, vimos o Congresso Nacional Africano na África do Sul. Em todas as últimas eleições, esses partidos perderam apoio. Será que há um problema com esses partidos que nasceram durante a Luta Armada de Libertação e agora enfrentam dificuldades para renovar as suas propostas e conexão com a população? Não seria o momento para esses partidos, originários da Luta Armada de Libertação, fazerem uma autocrítica, uma introspecção?

PR JOÃO LOURENÇO – Cada um que faça a sua introspecção. Mas eu repito dizendo que as sociedades de hoje não são as mesmas de há 30, 40 anos. É normal que isso aconteça. Eu vejo isso com a maior normalidade, que o eleitorado dos partidos políticos seja flutuante, não seja permanente. O número não pode ser sempre o mesmo. É normal que assim seja. Se não fosse assim é que não seria normal. Isso acontece com todos os partidos, não apenas os das lutas de libertação. Acontece com todos os partidos no mundo.

Só assim se compreende que haja alternância, não é? O Partido Democrata nos Estados Unidos da América, de repente, perdeu votos a favor do outro partido, o Republicano. Então, essa preocupação não é só dos nossos partidos, é universal.

JEUNE AFRIQUE – Sobre a situação de segurança na província de Cabinda, que ainda preocupa os investidores, o Senhor considera a FLEC um movimento semelhante ao M23? Ou seja, um movimento político-militar com o qual é necessário dialogar e negociar?

PR JOÃO LOURENÇO – Não! Não, porque a FLEC não representa nenhum perigo para o território angolano e, em particular, para o território de Cabinda. E não é verdade que a situação de segurança em Cabinda desencoraje o investimento. Nós temos investimento privado em Cabinda. A petrolífera americana está em Cabinda há 70 anos. Nunca saiu. Nunca se sentiu ameaçada.

Houve uma tentativa de sabotagem ainda no tempo da guerra, feita por um comando especial sul-africano. Foi o único caso de ameaça à segurança da Chevron em Cabinda. Agora mesmo, está uma entidade privada a construir aquela que vai ser a única refinaria de Cabinda. Cabinda nunca teve uma refinaria de petróleo, vai ter até ao final deste ano. É investimento privado, não é investimento público.

Então, não entendo do que é que me está a falar. Que a situação desencoraja o investimento privado, os investidores a trabalhar em Cabinda? Isso não é verdade, porque, para ser verdade, tinha que me apresentar factos. Eu não conheço factos. E a prova de que há confiança da parte dos investidores privados é que está a ser construída uma refinaria com investimentos privados.

JEUNE AFRIQUE – Senhor Presidente, permita-nos fazer uma pergunta delicada…

PR JOÃO LOURENÇO – Os políticos têm que estar preparados para todo o tipo de perguntas…

JEUNE AFRIQUE – A Constituição estabelece que um presidente não pode exercer mais de dois mandatos consecutivos. Portanto, este é, em princípio, o seu último mandato, que termina em 2027. O que o Senhor realmente pretende fazer?

PR JOÃO LOURENÇO – Bom, eu não sei porquê considera essa questão delicada. Para mim não é delicada. É delicada porquê? Se a Constituição diz isso, cumpra-se! Mas antes de dizer ‘cumpra-se’, deixe que lhe recorde que, se houvesse essa intenção por parte do MPLA – essa intenção nunca é das pessoas individualmente, é dos partidos políticos -, se tivesse havido a intenção da parte do MPLA em alterar a Constituição para permitir um terceiro mandato ao Presidente da República, tê-lo-ia feito. Porque, no meu primeiro mandato, por iniciativa do MPLA, que tinha maioria qualificada no Parlamento, tinha mais de 2/3, poderia ter alterado o artigo que estabelece que só tem dois mandatos. Teve essa possibilidade. A iniciativa de mexer na Constituição naquela altura foi nossa. Mexemos em tudo o resto, não tocámos neste quesito da limitação dos mandatos em dois.

Fala-se aí muito, porque “quer terceiro mandato, quer o terceiro mandato”… Tê-lo-íamos feito. Teríamos mudado. Ali não haveria milagres a fazer. Ninguém conseguiria impedir que essa alteração fosse feita. Ninguém, porque o MPLA, naquela altura, tinha a maioria qualificada de 2/3 no Parlamento. Portanto, tinha, como se costuma dizer na gíria, a faca e o queijo na mão. E nós não usámos a faca para cortar o queijo na medida dos nossos interesses, se tivesse havido esse interesse de fazer com que o Presidente da República tivesse mais do que dois mandatos.

JEUNE AFRIQUE – Já pensou, para si mesmo, em um perfil de sucessor?

PR JOÃO LOURENÇO – Sim, com certeza que já. Não seria normal não o fazer. Já pensei. E em termos muito gerais, o que eu devo dizer é que o perfil do meu sucessor deve ser alguém que venha a servir o país, igual ou melhor do que eu estou a fazer. Alguém que faça o que eu estou a fazer, mas, de preferência, que faça ainda melhor do que eu estou a fazer.

JEUNE AFRIQUE – O que pretende fazer depois de 2027?

PR JOÃO LOURENÇO – Continuar a servir o país.

JEUNE AFRIQUE – Continuar a servir de que forma?

PR JOÃO LOURENÇO – De várias formas. Servir o país não é preciso ter funções adquiridas por via de uma eleição, adquiridas por via de uma nomeação. Como patriota que sou, e enquanto tiver saúde, de certeza eu vou continuar a servir o meu país da melhor forma que puder. Falando, escrevendo, estarei a contribuir para o engrandecimento do meu país.

JEUNE AFRIQUE – Estamos há 23 anos após o fim da guerra civil em Angola. Para o Senhor, a Reconciliação Nacional está concluída? A UNITA tornou-se um partido como os outros?

PR JOÃO LOURENÇO – A reconciliação nacional é um processo contínuo que não tem data de arranque e data de fecho. Ou melhor, data de arranque teve, mas não tem data de fecho. A reconciliação é um processo que é permanente. Daqui a 50 anos ainda vamos estar a falar da reconciliação. Isso aconteceu com outros países. Portanto, é um processo contínuo. É evidente que, à medida que os anos vão passando, talvez não haja tanta necessidade de as pessoas falarem em reconciliação, mas ela, mesmo subtilmente, sem as pessoas darem conta, vai continuar a acontecer.

E Angola não tem grandes razões de queixa em relação a esse nosso processo de reconciliação, sobretudo pelo facto de, em 23 anos, o país não ter voltado às armas. O país não voltou à guerra. Nem tudo foi uma perfeição nestes 23 anos, mas o simples facto de o país não ter voltado às armas já é razão suficiente para nos darmos por felizes. Porque também não há sociedades onde não haja, às vezes, necessidade de alguém falar mais alto, de alguém dizer “você está errado”. Todas as sociedades têm coisas. Alguém tem sempre algo a apontar ao outro, mas desde que isso não leve a extremos, sobretudo ao retomar das armas, temos que nos sentir felizes por isso.

JEUNE AFRIQUE – O Senhor apresentou desculpas oficiais de Estado às vítimas da repressão da tentativa de golpe de Nito Alves em 1977. Isso é suficiente para acertar as contas e encerrar as feridas do passado?

PR JOÃO LOURENÇO – Senhor François Soudan, o pedido de desculpas não foi apenas e concretamente em relação ao 27 de Maio. A minha declaração é pública – escrita, voz e imagem. Eu pedi desculpas e o perdão dos angolanos pelas vítimas de todos os conflitos que se abateram sobre a nossa terra, o nosso povo, desde a proclamação da nossa Independência.

E é óbvio que, entre estes conflitos, um dos que mais visibilidade teve foi, sem sombra de dúvidas, o 27 de Maio, mas não só. Houve a história das mortes desnecessárias na Jamba, em que pessoas foram atiradas para a fogueira com o público forçado a assistir, até obrigados a alimentar as chamas da fogueira, indo buscar lenha.

Houve outras mortes de figuras nacionais, fora do quadro do 27 de Maio. Quando digo mortes, [quero dizer] assassínios, porque uma pessoa pode morrer com um paludismo. Não me estou referir a isso. Estou a referir-me a assassinatos com pendor político de figuras como Tito Chingungi, Wilson dos Santos, para citar apenas esses. É em relação a tudo isso que eu entendi que devíamos pôr uma pedra por cima disso e começar uma nova página.

A estes conflitos está ligada a necessidade de o Estado, que é a única entidade que tem essa capacidade – evidentemente com a colaboração da sociedade civil, porque sem ela também o Estado não pode fazer tudo -, fazer um investimento no sentido de se localizarem os restos mortais dessas mesmas vítimas dos tais diferentes conflitos. Isso leva tempo, mas está sendo feito. Começou a ser feito e está a ser feito. Já houve alguns casos de sucesso em que o DNA das ossadas coincide com o DNA dos familiares mais directos. Esses restos mortais, essas ossadas, foram entregues às famílias, realizaram-se funerais condignos, as famílias sentiram-se aliviadas. Só que o número é tão grande que o Estado não pode parar.

Esse trabalho da CIVICOP, a comissão que foi constituída para tratar desse assunto, tem que ter continuidade e está a continuar a trabalhar. Das informações que tenho, creio que, muito brevemente, mais ossadas serão entregues a familiares das vítimas.

JEUNE AFRIQUE – Daqui a pouco fará 50 anos desde que, em 11 de Novembro de 1975, Angola proclamou a sua Independência. O Senhor Presidente lembra-se do que estava a fazer naquele dia? Como viveu esse momento? Onde estava e como experimentou essa jornada histórica?

PR JOÃO LOURENÇO – Eu passei a transição do dia 10 para o dia 11 de Novembro de 1975 na província de Cabinda, numa unidade militar onde me encontrava. E, na altura, estávamos a enfrentar a ameaça de uma invasão externa a partir do território do então Zaíre, hoje República Democrática do Congo.

A ameaça não foi apenas aqui, na periferia de Luanda, em que os invasores chegaram até Kifangondo, onde foram travados e tiveram que recuar, como na província de Cabinda também. Houve, pelo menos, duas tentativas, uma pelo Sul, pela fronteira do Yema, onde a nossa unidade estava a enfrentar o avanço das tropas de Mobutu, como também pela parte Leste de Cabinda, em direcção ao Subantano, onde também foram travadas e tiveram que recuar.

No caso de Luanda, Kifangondo está aqui muito próximo de Luanda. No caso de Cabinda, a fronteira do Yema está a apenas 29 quilómetros da cidade. Está ainda mais próxima do que Kifangondo, em relação a Luanda.

Em qualquer dos casos, era uma questão de ganhar ou ganhar. Não se podia perder, porque as distâncias eram demasiadamente curtas. Se não se travam os invasores, em Kifangondo, facilmente chegavam a Luanda. Se não se travam os invasores ali na fronteira do Yema, do Ntó, fácil e rapidamente chegariam à cidade de Cabinda.

JEUNE AFRIQUE – Muitos dos nossos leitores não sabem ou talvez tenham esquecido que o Senhor também é militar, um general. O Senhor combateu em Cabinda contra o exército zairense, as forças de Mobutu. E, nos anos 1980, lutou no centro de Angola, desta vez contra a UNITA, correcto?

PR JOÃO LOURENÇO – Sim! O combate contra a UNITA foi permanente até 2002. Eu era militar, na altura. Tive um interregno de quatro anos em que estive na cidade de Moscovo, numa academia militar a formar-me militarmente. Regressado de lá, eu fui enviado para a Frente Centro, no Posto Comando da Frente Centro, onde fiquei pouco tempo e rapidamente chamado para exercer as funções de governador da província do Moxico, continuando a ser militar, obviamente, mas desempenhando a função de governador [Comissário Provincial, à época – nota da Redacção].

E, a partir daí, fui sendo puxado, digamos, para funções mais políticas do que propriamente operacionais. Então, fiquei três anos no Moxico como governador, três anos em Benguela, também como governador. Voltei de novo para a direcção das Forças Armadas, das FAPLA, onde assumi a função de chefe da Direção Política Nacional das FAPLA. Era o braço político do Exército, onde também fiquei pouco tempo. Fui imediatamente puxado para a direcção do partido [MPLA].  E aí, como Secretário para Informação, primeiro, e depois Secretário-Geral do partido, Primeiro Vice-presidente na Assembleia Nacional. Bom, a minha vida esteve sempre repartida entre funções militares e funções políticas.

JEUNE AFRIQUE – Mas o Senhor ainda se considera um militar?

PR JOÃO LOURENÇO – Sim, com certeza que somos. Com certeza que eu me considero. É verdade que ainda fui ministro da Defesa durante três anos. Essa foi a minha última função antes de concorrer a Presidente da República.

JEUNE AFRIQUE – Na sua página da Wikipédia, dois hobbies são mencionados: equitação e xadrez. O Senhor confirma isso? Ainda são seus passatempos?

PR JOÃO LOURENÇO – Sim, com certeza. Só que a equitação não se pode fazer no Palácio. É muito mais difícil. Xadrez ainda jogo, mas também o xadrez exige tempo. E um dos grandes inimigos desta função de Presidente da República é o tempo. É gerir o tempo. Como gerir o tempo? Tempo é sempre escasso.

JEUNE AFRIQUE – A política é um jogo de xadrez, não é?

PR JOÃO LOURENÇO – Sim! Ela em si, é. Sim, com certeza!

JEUNE AFRIQUE – Parece que sim.

PR JOÃO LOURENÇO – Sim. São da mesma família.

JEUNE AFRIQUE – O Senhor será o primeiro Chefe de Estado angolano a presidir à União Africana, já que, mesmo na época da Organização da Unidade Africana, nunca houve um presidente angolano nessa posição. Imagino que isso seja um motivo de orgulho para o Senhor, mas também um motivo de questionamento. O Senhor será o Presidente que conseguirá devolver eficácia e credibilidade à União Africana?

PR JOÃO LOURENÇO – Não! Não se pode chegar a essa conclusão, quando eu nem sequer ainda assumi. Esta análise, este julgamento, positivo ou negativo, só deve ser feito daqui a um ano, quando eu deixar de ser presidente temporário da União Africana. Portanto, eu acho que é cedo.

Que constitui para mim um motivo de orgulho, obviamente que sim, que constitui. Mas a Presidência da República dos países tem dessas coisas. A conjuntura, se calhar, não permitiu que os meus antecessores tivessem assumido este posto.

O Presidente Agostinho Neto esteve pouco tempo. Lamentavelmente, faleceu muito cedo. O Presidente José Eduardo dos Santos teve que, ao longo de muitos anos, enfrentar a agressão externa a Angola – a agressão sul-africana e mesmo o conflito interno com a UNITA.

Portanto, não podemos dizer que eu sou melhor que os outros, por isso. Não! Eles fizeram a parte deles, cada um na época em que desempenhou as funções de Presidente da República e, portanto, isso não é para se comparar. Porque é que só hoje Angola assume? Algum dia teria que ser. Calhou que vai ser agora, durante o meu mandato de Presidente da República de Angola, e vamos procurar fazer o nosso melhor, não por Angola só, mas sobretudo pelo continente.

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