O que se especulava nos últimos dias já é um facto. O Tribunal Constitucional declarou esta quinta-feira (7) “sem efeito” o XIII Congresso Ordinário da UNITA, que elegeu Adalberto Costa Júnior ao cargo de presidente do partido, “por violação da Constituição, da Lei e dos Estatutos de 2015”.
O Tribunal Constitucional (TC) declarou, igualmente, sem efeitos os ulteriores actos praticados nas eleições e nomeação dos órgãos singulares e colegiais, “devendo o partido manter a ordem de composição, competência, organização e funcionamento saída da direcção central eleita no XII Congresso Ordinário de 2015, validamente anotado e registado nos próprios arquivos deste Tribunal”. Noutras palavras, Isaías Samakuva reassume a liderança da UNITA, até à eleição do novo presidente.
A decisão consta no Acórdão nº 700/2021, relativo ao Processo nº 887-A/2021, no qual Manuel Diogo Pinto Seteco, Domingos Pedro, Dino Luís da Silva Chamucassa, Flávio da Costa Mucawa, Madilu Samuel Badeca, Dombaxe Sebastião Madura Garcia, Santos Fonseca Gouveia Diniz e Feliciano Gabriel Castro Kututuma, todos militantes da UNITA, pediam a impugnação da candidatura de Adalberto Costa Júnior ao cargo de presidente do partido.
No pedido, aqueles militantes sustentaram que o processo de candidatura de Adalberto Costa Júnior, que permitiu a sua eleição, foi “eivado de vícios, em razão de facto e de direito”.
Segundo o acórdão, os requerentes alegaram que Adalberto Costa Júnior apresentou a candidatura a presidente da UNITA, mas sendo do conhecimento público que era detentor, também, da nacionalidade portuguesa e que, por isso, era um candidato inelegível, nos termos do artigo 22º do Regulamento Eleitoral.
Esta norma estabelece que “são inelegível ao cargo de presidente da UNITA os membros que sejam titulares de alguma nacionalidade adquirida”. “E o facto de o candidato ser inelegível significa que não possuía capacidade eleitoral passiva”, consideraram os requerentes.
Adiantaram que Adalberto Costa Júnior, consciente de que a sua candidatura não deveria ser admitida por ilegitimidade, disse aos membros da Comissão Política que endereçou uma carta à Comissão dos Assuntos Estatutários e Jurídicos (competente para receber documentos e declarar a sua conformidade com o regulamento eleitoral), onde juntou o documento que garantia a perda da nacionalidade portuguesa e que, portanto, passaria a ter capacidade eleitoral passiva.
“Acontece, porém, que no dia 8 de Outubro de 2019, em reunião extraordinária do Comité Permanente, foi prestada a informação das candidaturas formalizadas e apuradas até ao dia 7 de Outubro de 2019 e que todas elas obedeciam aos requisitos legais”, realçaram os militantes, recordando que, naquela data (07 de Outubro) terminava o prazo de apresentação de candidaturas.
Os requerentes consideraram que Adalberto Costa Júnior “agiu de forma dolosa, tendo mentido ao Comité Permanente”. Por seu turno, este órgão, fazendo fé na informação da Comissão dos Assuntos Estatutários e Jurídicos, sem saber que, de forma dolosa, estava a ser induzida em erro, deu como elegível a candidatura de Adalberto Costa Júnior.
Os autores do pedido de impugnação consideraram que em todo o processo de candidatura ao XIII Congresso Ordinário da UNITA foram, sobretudo, violados os princípios da legalidade e da igualdade, previstos nos artigos 6º e 23º da CRA.
Terminaram as suas alegações solicitando que fosse declarada nula a candidatura de Adalberto Costa Júnior a presidente da UNITA , pois, no momento da apresentação, era inelegível, já que “possuía outra nacionalidade para além da angolana”.
Para a UNITA o problema tinha sido resolvido
Notificado pelo Tribunal Constitucional para exercer o seu direito de defesa, a UNITA, representada pela direcção, garantiu que “a nacionalidade portuguesa adquirida (por Adalberto Costa Júnior) se perdeu por renúncia”, facto que disse ter sido retratado publicamente e que “é de conhecimento inquestionável, sobretudo dos membros, simpatizantes e amigos” do partido.
“É evidente que, à data da apresentação da sua candidatura, Adalberto Costa Júnior tinha a questão da renúncia à nacionalidade adquirida resolvida, cujo averbamento foi lavrado a 11 de Outubro de 2019, nos termos do artigo 8° da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, resultante do Processo nº 80042 – SITPRO/2021 da Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa”, fundamenta a UNITA, citada no acórdão.
Para aquele partido, nos termos regulamentares, naquela altura, não era exigível a Adalberto Costa Júnior a apresentação de averbamento nenhum, pois poderia fazê-lo a posterior; mesmo que, estatutariamente, o presidente da UNITA seja o cabeça de lista pelo círculo nacional e candidato ao cargo de Presidente da República.
No início da contestação, a UNITA referiu que apenas dois dos requerentes (Cândido Moisés e Mandilu Samuel Badeca) foram delegados ao XIII Congresso Ordinário, por terem juntado nos autos os referidos passes. Os outros não se lhes reconhece legitimidade para demandar.
O partido terminou pedindo que fosse julgado procedente a contestação e extinto o processo, sem a resolução do mérito, ou declarado improcedente o pedido dos requerentes.
Entretanto, analisados os factos, o TC considerou que assiste razão aos requerentes e declarou nulo o processo de candidatura de Adalberto Costa Júnior, “por violação dos princípios da legalidade e da competência dos órgãos internos, bem como da organização e funcionamento democrático dos partidos políticos e da elegibilidade do presidente”.
O TC fundamenta a decisão com o que estabelece o nº 2 do artigo 6°, do nº 1 e da alínea f) do nº 2 do artigo 17°, ambos da CRA, do artigo 1° e da alínea h) do nº 2 do artigo 20° e do nº 3 do artigo 25°, da Lei dos Partidos Políticos, bem como dos artigos 1°, 48° e nº 3 do artigo 89°, todos dos Estatutos da UNITA, de 2015.
Membros tinham consciência da violação dos estatutos
O acórdão refere, a dado passo, que “não faltaram reacções, por parte dos membros presentes na reunião do Comité Permanente, quanto à violação das normas legais e estatutárias.
A decisão transcreve a acta nº 51/EXTRA/2019, de 21 de Outubro, que diz o seguinte: “Foram analisados os documentos apresentados e verificou-se que os mesmos são autênticos e que, nos termos do artigo 8º da Lei portuguesa nº 37/81, de 3 de Outubro, provam sem qualquer dúvida a perda da nacionalidade portuguesa, pelo requerente. Deste modo, foi eliminada a condicionante antes estabelecida ao candidato Adalberto Costa Júnior e ficou aceite, sem mais reserva, a sua candidatura. O Fórum debruçou-se sobre o parecer da Comissão de Mandatos que rejeitara esta candidatura.
No entanto, após apresentação de um recurso pelo proponente, o Comité Permanente decidiu dar um prazo de oito dias para que o “Grupo de Sábios” pudesse analisá-lo com mais propriedade. Consequentemente, o parecer deste Grupo de Trabalho Ad Hoc (Grupo de Sábios) aconselhou que a candidatura do Vice-Presidente fosse validada, apesar disso e daquilo.
Após várias intervenções, umas a favor e outras contra, alguns membros interrogaram-se se algum dos candidatos não usaria este “arranjo” para impugnar o Congresso, por ser anti-estatutário. Outros defendiam que os candidatos assinassem um documento de compromisso de não impugnação do Congresso. Por sua vez, o candidato José Pedro Kachiungo disse que o que devia prevalecer era o parecer dos Mais Velhos (…). A jurista Mihaela Webba disse que, ao contrário da maioria, não concordava com esta decisão, porque violava os Estatutos, e sugeriu que houvesse votação secreta.
Seguidamente, procedeu-se a uma votação aberta e das cinquenta e sete presenças, quarenta e sete votaram a favor e dez votaram contra. Finalmente, o Comité Permanente deu parecer favorável sobre a candidatura…”.
Juíza Josefa Neto foi voto vencido
Entre os sete magistrados do Tribunal Constitucional que julgaram o caso, Josefa Neto é a única que teve voto vencido.
Sobre a violação do prazo de apresentação da candidatura, a juíza refere, na sua declaração de voto, que, “em bom rigor, o que os autos ilustram é que Adalberto Costa Júnior deu início ao processo de perda da nacionalidade portuguesa ainda antes da apresentação da sua candidatura à presidência da UNITA e que, seguidamente, prosseguiu com a tramitação necessária à formalização desse processo (perda da nacionalidade).
UNITA diz que precisa de tempo para analisar acórdão
O Jornal de Angola contactou, ontem, o até então porta-voz da UNITA, Marcial Dachala para reagir à decisão do Tribunal Constitucional que anula o XIII Congresso ordinário, que elegeu Adalberto Costa Júnior.
Marcial Dachala explicou que, por se tratar de um assunto novo, a UNITA precisa de tempo para analisar o conteúdo do documento.
Questionado sobre o assunto, antes da publicação do acórdão, Adalberto Costa Júnior falou ainda da eventual anulação, pelo Tribunal Constitucional, disse que o partido não iria fazer nenhum pronunciamento sobre o assunto enquanto não tivesse factos. “Tivemos, estranhamente, os órgãos oficiais a darem indicação uns aos outros com uma fuga de informação difícil de explicar, mas estamos a aguardar que haja a publicação do acórdão para podermos nos pronunciar”, afirmou.
Adalberto Costa Júnior falou da credibilidade das instituições e a função para a qual existem e estão criadas. “Elas devem ser factores de credibilidade, de garantia do cumprimento da Lei e não de instabilidade”, disse.
Fonte:JA