Apenas Mussund’amigos!

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A expressão Mussund’Amigo, levada à poesia por António Agostinho Neto, foi adoptada por colegas de um curso terminado há quase um quarto de século.

A conversa dos Mussund’amigos, uma de muitas que eles mantêm quando se encontram, começou assim:
– Ó Ceita, aceitas ser o padrinho do KR?
Havia quase fila para abraçar a Celi que é madrinha do KR. O afilhado, nos seus quase dois metros e corpo de imbondeiro bem enxuto, estava colado a ela e de olhos nos que se aproximavam dela.
– Não. Só vim mesmo cumprimentar e nada mais. – Respondeu o Ceita, depois de receber um olhar fixo e determinante do KR.
Possas, na vida, afinal, há dessas coisas. A Celi é uma moça, já senhora na casa dos 40 anitos, que conserva uma “boniteza” que não quer ir embora, acrescida de naturais e bem prendados glúteos. “Monumental, parece obra de arte!” – Ouvia-se aos murmúrios.
– Mas ó Ceita, – continuou o PCA Star – só querias mesmo cumprimentar a Celi, nem abraçar nem nada?
– Com aquelas toneladas de fibra do KR a proteger a Celi, querias mais o quê? Sabes lá se têm contrato de não aproximação?
O Ceita estava já a “dar costas” ao casal de colegas, quando o PCA Star foi ter com ele.
– Epá, isso vai sair na crónica!

– Possas, queres que saia? Então que saia, pá. Tu vês, nê? É que quando a madrinha é boa, todos querem dar um abraço. Às vezes, na rua, vemos mulheres de silhueta incomum e da boca nem brota o simples atrevimento de uma saudação. Mas aqui a colega é nossa. El’ê nossa kamba, nossa Mussund’amiga de todos nós e de todos os tempos. Só mesmo aquela corpulência de pugilista do KR é que aos tímidos desencoraja o abraço.

Os Mussunda, como eles se tratam, já levam, para todos os efeitos, mais de 26 anos. São ex-colegas do Curso Médio de Jornalismo ministrado no IMEL e que mantêm os vínculos de amizade que chega à irmandade.
Não se constituindo em uma organização formal, com registo cartorial, são tão organizados e unidos que metem inveja a muitas ONG e similares. Quando decidem reencontrar-se, não medem distâncias nem circunstâncias e transformam o local do encontro numa grande maratona festiva com manjares, muitos falares e frascos moderados. Foi assim, mais uma vez, no último sábado de 2019.

Capitaneados pelo Star (o gajo tem a mania de ser PCA) e Jack Nicholson, o administrador “ejonera” que põe ordem no grupo, os Mussunda aproveitaram juntar à fome a vontade de comer. Um seu correligionário, o Kamba João, acabara de ser nomeado ao posto de Secretário de Estado. Às lembranças de tempos vividos no IMEL juntou-se o Sílvio Costa, professor de Língua Portuguesa, na nona classe daquele tempo.
– Como é profº, ainda se lembra da sua primeira aula? – Indagou o Kamba João.
– Eu não. Só me lembro que fui bem acolhido como professor e hoje como vosso amigo. Isso sim. Fizemos família! – Respondeu o irmão de Don Kikas (músico) e ex-seminarista.

Kamba João, o historiador do grupo, fez gala à sua memória e descreveu o primeiro exercício dado pelo professor Sílvio na sua primeira aula, em Janeiro de 1994, e todos recuaram 25, 26, 27 e 28 anos para os “mais antigos combatentes”. Mas a procissão ainda não chegara ao adro. O assunto do dia, já comentado durante semanas, era a declaração do Armandinho à Lalê.
– Sabes, Lalê, quando não te vejo, o meu coração troveja à mesma velocidade a que meus olhos derramam lágrimas fecundas. – Atirou ele, seguido por aplausos. Era tudo na galhofa.

E a Lalê, que fez olhos de boneca perdida, fingiu que se entregava desalmada ao seu corpo comprido e de pouca força, quando, na verdade, era ao “segurança da madrinha” que empreendera atenção nos tempos de “amor platônico”.
– Posso declarar?    
– Pode! – Responderam          todos.
– Posso escolher? – Voltou a gritar a Lalê (eram tantas vozes e tantas conversas periféricas que só os gritos permitiam se impor).
– Escolhe. – Voltaram a vozeirar os que estavam atentos ao assunto.
Olho no Armandinho e mente no KR, Lalê anunciou a segunda opção.
Ouviram-se palmas e gritos.

O último evento, último mesmo, foi a reedição do trabalho final, também despedida de jovens e adolescentes, hoje formados e prendados, recitando, sob a batuta de Maninho e Kimbito, o poema “Renúncia Impossível” de Agostinho Neto. Caíram lágrimas de emoção, bateram-se rajadas de palmas e, em uníssono, estalaram o último “tchim-tchim”.
Como os Mussunda, já os galos estavam roucos de tanto cantar!

Fonte:JA

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