“Queríamos apenas levar alegria aos corações das pessoas”

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Num ano atípico, por culpa da pandemia da Covid-19, tudo parecia estar perdido para muitos grupos artísticos. Outros não resistiram, não por vontade própria, mas pelas circunstancias que o mundo está a viver, tiveram mesmo que “atirar a toalha ao tapete” como sinónimo de derrota.

Outros, ainda, continuaram à bordo do navio sem “destino” aparente. Foi o caso do grupo de dança “Fenómenos do Semba”, que na “caminhada pelo deserto” surge do nada o oásis, que veria mudar a história de um grupo de jovens angolanos “desconhecidos”. Na inocência da brincadeira, num ambiente festivo, descontraído, típico dos musseques luandenses, onde até pode faltar de quase tudo, menos alegria característica dos angolanos. A inspiração e criatividade artística dos integrantes do grupo fez o mundo parar, observar, ensaiar e dançar “Jerusalema”. Cada um ao seu jeito, no compasso frenético do estilo kuduro, o grupo “Fenómenos do Semba”, dava inocentemente “um passo virtual para a conquista o mundo”. De “Fenómenos do Semba” à “Fenómeno do Mundo”. Foi assim que o grupo celebrizou-se ao fazer uma coreografia do tema “Jerusalema”.

A caminhada   

Tudo aconteceu em Fevereiro  ano passado, quando o grupo se reuniu para festejar o quinto aniversário. Dançarinos angolanos festejaram, em tempo de pandemia da Covid-19, sem imaginar que a celebração iria correr o mundo. Num ambiente restrito, apenas com os integrantes do grupo, devido à Covid-19, decidiram com os pratos de comida na mão, pôr-se a dançar a conhecida “dança da família”, ao som da música “Jerulasema Ikayalami”, do DJ e da cantora sul-africanos Master KG e Nomcebo Zikobe.

“A intenção era somente colocar alegria nos corações das pessoas” como conta, o responsável do grupo Adilson Maíza, acrescentando que o grupo não tinha noção em quantos países as pessoas têm dançado ao som de “Jerusalema”, mas garante que todos os dias, recebem novos vídeos, ao ponto de mobilizar companhias aéreas, funcionários de hospitais, religiosos,  a Orquestra “Philharmonic” internacional, bombeiros, polícias, crianças, jovens, adultos, idosos e vários movimentos culturais espalhados pelo mundo. Mostrar a simplicidade dos angolanos, em particular, e dos africanos, no geral, foi a ideia inicial, segundo o responsável do grupo. Do vídeo, apenas participaram os bailarinos Pires Kizomba, Telma André, Silvia Bento, Bilson Negrine e Francisco Fernandes. Fazem ainda parte do projecto os bailarinos Gregório Pires, Bilson Capempa, Elias Tungo, Sileiny de Melo e Asle Cardoso.

Eles, num total de dez elementos, oito vivem no país e dois em Portugal, onde têm estado também a ministrar aulas de dança moderna e tradicional. O grupo pode ser contactado através das redes sociais. O grupo, disse, participa, igualmente, em conferências e espectáculos internacionais

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Adilson Maíza, de 24 anos, nascido na província da Lunda-Norte, classifica-se como um jovem batalhador, estudante, bailarino, coreógrafo, professor de dança de carácter internacional. Tem o curso profissional médio, em Mecânica Industrial, Frio e Climatização e superior de Gestão Aeronáutica. Em Luanda, vive no bairro Cassenda.

O grupo surgiu exactamente porque já dançam há mais tempo. Adilson Maíza, juntamente com a Telma André, Jone Valentino e Nelinha Gonga, os dois últimos a residirem, actualmente, em Portugal, pertenciam ao grupo de dança “União Clássicos do Semba”, que durante muitos anos, vinha a desenvolver trabalhos em prol das danças tradicionais e contemporâneas. A vontade de inovar, explicou, levou alguns integrantes a abandonarem o grupo por já não se reverem nos ideais do antigo grupo que era liderado pelo coreógrafo Narciso Cardoso “Zelão”. Depois de uma conversa amena com Zelão, frisou, decidiram abandonar o grupo e criar o “Fenómeno do Semba”.

Com o passar do tempo, outros integrantes do antigo grupo foram integrando o novo projecto. Sem um local fixo, para os ensaios, o palco era mesmo a rua 18 do Mártires, como conta Adilson Maíza. Muitas vezes o grupo tinha que parar os ensaios para deixar os carros passarem. No início, o grupo dançava e ensaiava todo o dia. Depois dos compromissos pessoais, o grupo reunia-se sem um horário definido para os ensaios. O horário nocturno era o mais favorável, no período das 20h00 em diante, chegando muitas vezes a dançarem até de madrugada.

Fomos ao encontro do grupo no seu “quartel general”, situado no Bairro Cassenda, no residencial “Confidente”, e conversámos com alguns dos integrantes, numa altura em estavam prestes a começar os ensaios. O bailarino e estudante do curso de Energia e Instalações Eléctrica, Elias Tungo, de 19 anos, está no grupo há dois anos, decidiu entrar no projecto para crescer como dançarino. Por sua vez, há três anos como dançarina, Sileiny de Melo, de 19 anos, é estudante do curso de Ciências Económicas e Jurídicas no Ensino Médio, entra para o grupo somente em Setembro do ano passado , espera ser conhecida internacionalmente pelo seu trabalho. Já a bailarina, Telma André, de 22 anos uma das co-fundadoras do grupo, confessa que a dança nunca foi uma paixão, mas, hoje, já não vive sem a dança. Estudante universitária do segundo ano do curso de Contabilidade e Gestão, disse estar a viver um dos seus maiores sonhos.


Retornos financeiros

O grupo tem sentido os efeitos do impacto positivo de uma brincadeira inocente, com os pratos de comida na mão, que colocaram-se a dançar a famosa “dança da família”, ao som da música “Jerulasema”. Maíza reconhece que a “vida financeira” do grupo melhorou muito desde o sucesso da dança. A pesar dos constrangimentos causados pela Covid-19, o grupo passou a ter eventos todos os dias, e a recompensa, disse, tem permitido financiar os estudos dos integrantes do grupo e sustentar as próprias famílias, por isso, são obrigados a ensaiar, também, todos os dias para manter a forma.

Adilson Maíza acredita que financeiramente o grupo ganharia mais se não fosse a pandemia da Covid-19, pelo número de solicitações no país e no estrangeiro. Com a criação do grupo a 12 de Fevereiro de 2015, com objectivo de massificar e preservar a cultura angolana através da dança, disse, havia a necessidade de publicitar e projectar a imagem do grupo pelas rádios e televisões. Ainda assim, sabia a pouco, e foi assim que surgiu a ideia, revela, de começar a colocar alguns vídeos também a circular nas redes sociais. Foi desta forma que começaram a surgir convites para representar o país em eventos internacionais, desde ministrar workshop a participações em conferências. Antes mesmo do sucesso do “”Jerulasema”, o grupo já participou em varias actividades em mais de 15 países, embora não serem tão conhecidos. No Youtube, revelou, o grupo desde a sua criação até Fevereiro desde ano, tinha apenas 1.400 subscritores, depois do sucesso passou a ter 50 mil. Depois de disponibilizarem o vídeo na Internet, dois dias após o aniversario do grupo, passaram a ter dois milhões de visualizações, o que surpreendeu o grupo. Passado mais de oito meses, o grupo passou a ter mais 14 milhões de visualizações. “Passamos a receber mensagens de felicitações, ligações e convites por toda a parte, mas, infelizmente não podemos corresponder por causa da pandemia”.

Vice-Presidente felicita iniciativa

O grupo foi, recentemente, recebido pelo Vice-Presidente da República, Bornito de Sousa, que o felicitou pelo sucesso e aproveitou para ouvir os projectos e preocupações do grupo. Enquanto grupo de jovens, de acordo com Adilson  Maíza, o Vice-Presidente da República, prometeu fazer cumprir com algumas das necessidades enquanto jovens sonhadores e artistas, na criação de uma academia de dança, para garantir formação sustentada, com bases científicas aos jovens.

A pesar de terem outras valências, é mesmo na dança, onde pretendem obter uma profissionalização. De forma presencial, o grupo quer, tão logo seja possível, realizar digressões pelo país e no estrangeiro.  “Estamos à espera, para que as coisas possam funcionar, porque é bem verdade que o lado da dança em Angola ainda carece de muito apoio, então, esperamos também que o Estado nos apoie, porque se fizemos isso é porque podemos fazer muito  mais, sozinhos é difícil”, frisou.


Até a Janeth Jackson gostou

Ver o mundo a olhar para o grupo de uma maneira diferente da perspectiva anterior ao sucesso, tornou-se “num sentimento de responsabilidade acrescida, o que obriga o grupo a trabalhar mais afincadamente nos detalhes das coreografias” como reconheceu Adilson Maíza.

Ainda no meio da gestão do impacto viral pelo mundo todo por causa da dança coreografada “com um prato de comida na mão e uns toques de dança”, ao som de uma música sul-africana, “Jerulasema Ikayalami”, o “Fenómedo do Semba” foi surpreendido a ser contactado através da rede social Instagram pela conceituada cantora norte-americana, Janeth Jackson, que os propôs uma parceria, para participar na produção de um videoclip, tão logo possível.

O dançarino disse que o grupo passou a pertencer ao mundo, “procurando espalhar os ritmos angolanos para outras realidades com o objectivo de massificar, divulgar e preservar a cultura do país e dar a conhecer além-fronteiras”.

Fonte:JA

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